quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

DIÁRIO DO ALENTEJO EDIÇÃO 1553

Editorial


Matança

Paulo Barriga

Matar um porco não é

a mesma coisa do que

matar um jornal. Ou

uma rádio. Ou um qualquer órgão

de comunicação de massas.

Matar um porco é um ato cultural

de grande enraizamento e, acima

de tudo, é uma atitude económica

inteligente. Matar um jornal é precisamente

o inverso: é uma maneira

retrógrada, covarde e pouco

lúcida de lidar com a cultura e a liberdade

de expressão. Por muito

“mau” ou “vincado” que seja o jornal,

este reflete sempre um olhar

muito próprio, o seu, sobre a sociedade.

A isto chama-se pluralidade.

Goste-se ou não. Quando se mata

um porco, enche-se sensatamente

a arca. Quando se mata um jornal

empobrece-se o espírito. Um jornal

não é um porco, já se sabe. Até

no seu extermínio são diferentes. O

porco incha os céus com a sua vontade

de viver. Meter a faca no cabeçalho

de um jornal faz apenas jorrar

o silêncio. Beja é uma cidade de

jornais. Diversos. Opostos. Muitos.

Sempre o foi, desde o tempo do

Liberalismo. Mas esta semana começaram

a aparecer os primeiros

sinais da matança. O bispo de

Beja diz que é cada vez mais difícil,

se não impossível, manter o órgão

da Igreja, o “Notícias de Beja”, que

existe há 84 anos e que é herdeiro

do republicano “Ala Esquerda”.

No seu último editorial, o diretor

do “Correio Alentejo” afirma que,

sozinho, não resistirá muito mais

tempo. A quadra não está nada favorável

para se continuar a publicar

o “Alentejo Popular”. As rádios,

já aqui o noticiámos, estão a

passar grandes embaraços financeiros.

Os órgãos de comunicação

social sobrevivem, na essência, da

publicidade. E da vontade contributiva

dos seus leitores. Numa região

sem empresas, a publicidade

é hoje uma miragem. E o empobrecimento

galopante das pessoas

afasta-as de certos “supérfluos”,

como os jornais. E neste deserto

parece que sobram apenas as autarquias.

Que deveriam ser mais

interventivas nesta matéria, sem o

serem suficientemente. Para não

se deixarem cair na tentação. Mas

também elas, as câmaras, nestes

dias, andam pela rua da amargura.

Esta semana, a convite de um colaborador

do “DA”, provei a melhor

moleja dos últimos anos, mas o sabor

que ainda hoje trago na boca

não é o do vinagre que não

deixa coalhar o sangue do porco.

É o do silêncio acre

que pesa sobre a matança

da imprensa

regional de Beja.



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