Editorial
Matança
Paulo Barriga
Matar um porco não é
a mesma coisa do que
matar um jornal. Ou
uma rádio. Ou um qualquer órgão
de comunicação de massas.
Matar um porco é um ato cultural
de grande enraizamento e, acima
de tudo, é uma atitude económica
inteligente. Matar um jornal é precisamente
o inverso: é uma maneira
retrógrada, covarde e pouco
lúcida de lidar com a cultura e a liberdade
de expressão. Por muito
“mau” ou “vincado” que seja o jornal,
este reflete sempre um olhar
muito próprio, o seu, sobre a sociedade.
A isto chama-se pluralidade.
Goste-se ou não. Quando se mata
um porco, enche-se sensatamente
a arca. Quando se mata um jornal
empobrece-se o espírito. Um jornal
não é um porco, já se sabe. Até
no seu extermínio são diferentes. O
porco incha os céus com a sua vontade
de viver. Meter a faca no cabeçalho
de um jornal faz apenas jorrar
o silêncio. Beja é uma cidade de
jornais. Diversos. Opostos. Muitos.
Sempre o foi, desde o tempo do
Liberalismo. Mas esta semana começaram
a aparecer os primeiros
sinais da matança. O bispo de
Beja diz que é cada vez mais difícil,
se não impossível, manter o órgão
da Igreja, o “Notícias de Beja”, que
existe há 84 anos e que é herdeiro
do republicano “Ala Esquerda”.
No seu último editorial, o diretor
do “Correio Alentejo” afirma que,
sozinho, não resistirá muito mais
tempo. A quadra não está nada favorável
para se continuar a publicar
o “Alentejo Popular”. As rádios,
já aqui o noticiámos, estão a
passar grandes embaraços financeiros.
Os órgãos de comunicação
social sobrevivem, na essência, da
publicidade. E da vontade contributiva
dos seus leitores. Numa região
sem empresas, a publicidade
é hoje uma miragem. E o empobrecimento
galopante das pessoas
afasta-as de certos “supérfluos”,
como os jornais. E neste deserto
parece que sobram apenas as autarquias.
Que deveriam ser mais
interventivas nesta matéria, sem o
serem suficientemente. Para não
se deixarem cair na tentação. Mas
também elas, as câmaras, nestes
dias, andam pela rua da amargura.
Esta semana, a convite de um colaborador
do “DA”, provei a melhor
moleja dos últimos anos, mas o sabor
que ainda hoje trago na boca
não é o do vinagre que não
deixa coalhar o sangue do porco.
É o do silêncio acre
que pesa sobre a matança
da imprensa
regional de Beja.
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