quinta-feira, 12 de abril de 2012

Diário do Alentejo Edição 1564



Editorial


Abril

Paulo Barriga

Em nome do equilíbrio das

contas públicas e da competitividade

da economia

nacional, o Governo, nesta sua assumida

versão de marioneta obediente,

anda com vontade de abolir

do calendário alguns feriados.

Quatro. Dois que a Igreja há de escolher

de entre o seu rosário pessoal.

Outros dois provenientes do

paganismo histórico ou cultural.

Destes últimos, aqueles que parecem

mais em risco são o dia em

que celebramos o fim da realeza. O

outro, o dia em que sovámos os espanhóis

em definitivo e selámos a

nossa independência. Ou seja, em

nome da mais comovedoramente

patética das medidas inscritas no

memorando de desentendimento

entre a troika e os povo de Portugal,

vamos deixar cair dois dos principais

padrões que nos recordam a

nossa identidade, a nossa revolta,

a nossa soberania, a nossa diferença

e o direito que a ela temos: à

diferença. Qualquer mancebo de

Belém ou de São Bento sabe que a

extinção destes feriados é uma medida

do campo da sonsice e da hipocrisia.

Mero show-off. Que não

acrescenta nem mais um único parafuso

à nossa máquina produtiva.

E apenas nos apequena em termos

de soberania. Não deixa de ser

curioso o facto de o Governo, embora

cheio de vontadinha, ter colocado

logo de parte a possibilidade

de apagar o 1.º de Maio ou o 25 de

Abril. O povo é – tem sido – sereno.

Mas a governança não sabe até que

ponto pode ir a sua brandura. No

fundo, explora-o, expolia-o, mas

receia-o. E teme-o porque sabe que,

de quando em vez, quando espremido

para lá do tolerável, o povo, a

candura lusitana, acaba por ser ferozmente

fatal para os seus oprimentes.

Tal como aconteceu a 1 de

dezembro de 1640. Tal como aconteceu

a 5 de outubro de 1910. Tal

como aconteceu a 25 de abril de

1974. Tal como poderá muito bem

acontecer num destes dias. E aí, em

vez de nos livrarmos de alguns feriados,

teremos de acrescentar

nova data aos festejos da nação.

Com direito a foguetório, bombos

e a bonecos cabeçudos.

Titanic Acontece sempre que o homem

tenta dar a passada mais larga

do que a sua própria perna. O precipício

não faz parte dela, é a própria

História da Humanidade. E os

passos em frente são, afinal, meros

episódios, simples alegorias, dessa

mesma História. O Titanic naufragou

há 100 anos.



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