Editorial
Resgate
Paulo Barriga
Era palavra que se costumava
ouvir nos noticiários.
Apenas e raramente. Nas
reportagens sobre bandidagem.
Pedidos de resgate. Quando muito
em notícias sobre navios naufragados.
Resgates bem-sucedidos.
Palavra dada a malandros e a sequestradores.
Ou a bravos heróis.
Nos dias que correm, resgate, continua
a dar para os dois lados. Mas
ao mesmo tempo. Há tanto de vilanagem
como de salvação dos aflitos,
nos atuais resgates. Há tanto de
chantagem como de aparente benevolência,
quando se fala em resgatar
um país. Como agora acontece
com Portugal. Uma nação à
deriva que grita por socorro. Mas
que acaba por ser socorrida não por
uma alma generosa, mas por uma
verdadeira quadrilha de raptores.
Portugal foi resgatado por um
braço e foi-lhe pedido um resgate
impagável, pelo outro. Em simultâneo.
É o que sempre aconteceu nos
mares de piratas. Que hoje têm outro
nome, mas a mesma lei: mercados.
Portugal está na bancarrota.
O Estado faliu. Naufragou. Do alto
da torre do navio, capitão e oficiais,
atormentados, tentam salvar a pele
lançando marujos ao mar. Aos tubarões.
Mas o rombo maior é de
tal forma evidente que nada salvará
a barcaça. E o imediato parece que
ainda não se deu conta das restantes
pequenas brechas que inviabilizam
definitivamente o casco. Reparou
que a Madeira metia água. Que os
Açores assim-assim. Mas ainda não
se apercebeu que cada uma das 308
autarquias do País, cada qual à sua
medida e dimensão, também estão
cheias de fissuras. E que, lá bem no
fundo, necessitam de ser resgatadas
por um governo já de si resgatado,
sem rota, nem rumo, nem ventos de
feição, de mão estendida, na Europa
dos pobrezinhos. Exemplo nada
inédito nem isolado é o da Câmara
Municipal de Beja. Que, a cada mês
que passa, vai abrindo rasgos de 200
mil euros na caixa das moedas. Sem
receitas próprias, carregada de dívidas,
incapaz de cumprir com os
seus compromissos, cada vez mais
desabonada de dinheiros do Estado,
refém da lei dos compromissos e talvez
de si própria, a autarquia vai ter
que lançar para o ar o seu derradeiro
very light. Na esperança que lhe atirem
uma boia de salvamento, uma
mão. Mas sabendo que ficará irreversivelmente
não com uma, mas
com as duas mãos atadas. São assim
os resgates, hoje, na era da pirataria
financeira.
1 comentário:
É a nossa Nau Catrineta,que em cada dia que acordamos,muito tem para nos contar.Podiamos tomar consciencia de "coisas" que podiam ir para alem de nos pasmar.Mas preferimos, ficar a bordo num canibalismo social, indolente,subserviente, que so foge a regra, quando a nossa humilde mesa, convidamos os "alguem" a quem acabamos por servir de banquete, mesmo quando somos só ossos e como esses nos doiem!Portugal,começa por pagar o teu resgate, e liberta um País que anda a saque.
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