quinta-feira, 26 de abril de 2012

Diário do Alentejo Edição 1566

Editorial


Resgate

Paulo Barriga

Era palavra que se costumava

ouvir nos noticiários.

Apenas e raramente. Nas

reportagens sobre bandidagem.

Pedidos de resgate. Quando muito

em notícias sobre navios naufragados.

Resgates bem-sucedidos.

Palavra dada a malandros e a sequestradores.

Ou a bravos heróis.

Nos dias que correm, resgate, continua

a dar para os dois lados. Mas

ao mesmo tempo. Há tanto de vilanagem

como de salvação dos aflitos,

nos atuais resgates. Há tanto de

chantagem como de aparente benevolência,

quando se fala em resgatar

um país. Como agora acontece

com Portugal. Uma nação à

deriva que grita por socorro. Mas

que acaba por ser socorrida não por

uma alma generosa, mas por uma

verdadeira quadrilha de raptores.

Portugal foi resgatado por um

braço e foi-lhe pedido um resgate

impagável, pelo outro. Em simultâneo.

É o que sempre aconteceu nos

mares de piratas. Que hoje têm outro

nome, mas a mesma lei: mercados.

Portugal está na bancarrota.

O Estado faliu. Naufragou. Do alto

da torre do navio, capitão e oficiais,

atormentados, tentam salvar a pele

lançando marujos ao mar. Aos tubarões.

Mas o rombo maior é de

tal forma evidente que nada salvará

a barcaça. E o imediato parece que

ainda não se deu conta das restantes

pequenas brechas que inviabilizam

definitivamente o casco. Reparou

que a Madeira metia água. Que os

Açores assim-assim. Mas ainda não

se apercebeu que cada uma das 308

autarquias do País, cada qual à sua

medida e dimensão, também estão

cheias de fissuras. E que, lá bem no

fundo, necessitam de ser resgatadas

por um governo já de si resgatado,

sem rota, nem rumo, nem ventos de

feição, de mão estendida, na Europa

dos pobrezinhos. Exemplo nada

inédito nem isolado é o da Câmara

Municipal de Beja. Que, a cada mês

que passa, vai abrindo rasgos de 200

mil euros na caixa das moedas. Sem

receitas próprias, carregada de dívidas,

incapaz de cumprir com os

seus compromissos, cada vez mais

desabonada de dinheiros do Estado,

refém da lei dos compromissos e talvez

de si própria, a autarquia vai ter

que lançar para o ar o seu derradeiro

very light. Na esperança que lhe atirem

uma boia de salvamento, uma

mão. Mas sabendo que ficará irreversivelmente

não com uma, mas

com as duas mãos atadas. São assim

os resgates, hoje, na era da pirataria

financeira.

1 comentário:

Eduardo Franco disse...

É a nossa Nau Catrineta,que em cada dia que acordamos,muito tem para nos contar.Podiamos tomar consciencia de "coisas" que podiam ir para alem de nos pasmar.Mas preferimos, ficar a bordo num canibalismo social, indolente,subserviente, que so foge a regra, quando a nossa humilde mesa, convidamos os "alguem" a quem acabamos por servir de banquete, mesmo quando somos só ossos e como esses nos doiem!Portugal,começa por pagar o teu resgate, e liberta um País que anda a saque.