Editorial
Nabal
Paulo Barriga
Não se pode ter sol na
eira e água do nabal.
Ao mesmo tempo. Diz
o povo. Debaixo da sua inabalável
sabedoria. Locução antiga,
comprovada pela passagem do
tempo. Dos tempos. Pelos ciclos
da vida. Mas que não se aplica
à Ovibeja, esse fenómeno paranormal
que há 29 anos a esta
parte assola a cidade de Beja.
Nem se aplica o velho ditado,
nem se aplicam as novenas pela
chuva. Por muito bem cantadas
e consumadas que elas sejam.
As novenas. Os agricultores
do Alentejo já se deveriam ter
apercebido desse admirável detalhe.
Há muito tempo. Sempre
que lhes falta a água nos seus
nabais, em vez de mendigarem
subsídios e preces, deviam antes
organizar uma Ovibeja. Que
é a única fórmula comprovada,
repetidamente demonstrada,
de trazer chuva ao Alentejo. Em
abundância. Ainda que os tempos
sejam de seca. Como este
ano aconteceu. Como sempre
costuma acontecer. A Ovibeja
girou já por várias datas diferentes.
Entre março e maio. E a
única participação na feira que
sempre esteve assegurada de um
ano para o outro foi a da chuva.
Água no nabal. Mas o curioso é
que, ao contrário do que seria de
prever, a chuva parece não afastar
o sol da eira. Em ano de profunda
depressão económica, financeira
e social, a Ovibeja
voltou a brilhar resplandecentemente.
Milhares e milhares
de visitantes acorreram à cidade
como se não houvesse amanhã.
Aliás, esta foi, por certo, uma
das mais concorridas edições
do certame. Demonstrando que
Beja necessita de iniciativas que
lhe levantem a autoestima. E a
Ovibeja, muito mais do que uma
feira de atividades económicas,
muito mais do que a velha feira
da bota caneleira, é hoje uma
feira de afetos. Uma feira de reencontros.
Uma feira de amizades.
O grande largo do Alentejo.
Sempre solarengo. Ainda que
possa estar a chover água a cântaros.
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