quinta-feira, 12 de julho de 2012

Diário do Alentejo Edição 1577


Editorial


Fundamental

Paulo Barriga

Erradamente, tudo indica,

temos tratado por

“fundamental” o texto

da Constituição da República

Portuguesa. Fundamental é algo bem

diferente de fundamentalista. Mas

até agora, com o fundamentalismo e

a deferência exigida, temos, de facto,

tratado por “fundamental” a Lei que

guarda as normas básicas do Estado

e os direitos e os deveres essenciais da

cidadania. As regras da democracia.

No entanto, a Constituição parece ser

fundamentalmente uma chatice. Um

empecilho e um aborrecimento para

aqueles que deitaram por terra a sua

doutrina primordial, a soberania nacional.

Em troca de um resgate financeiro

envenenado. E que ainda tiveram

a ousadia de fazer implodir o seu

mais justo artigo: o que fala da igualdade

de direitos e de deveres entre todos

os cidadãos portugueses. O corte

nos subsídios dos reformados e dos

funcionários do Estado, em exclusividade,

não revelou apenas uma mera

violação da Constituição. Foi um recuo

ideológico retrógrado e reacionário.

De baixo nível. O qual o Tribunal

Constitucional reconheceu a meio

do caminho. De forma intermitente,

mas reconheceu-o. Mas neste país

que fica para lá das fronteiras do sobrenatural,

o incrível, o inacreditável

tornou a acontecer: o Tribunal confirmou

que era fundamental salvaguardar

a Lei “fundamental”. Mas só

para o ano. Este ano imperará a ilegalidade,

a indecência e a injustiça. E

para o ano, logo se vê. E é esta a noção

de justiça intervalada do Tribunal

Constitucional. Porque, de facto, o que

aqui se revela é uma questão de justiça.

Ou de injustiça. Há vários anos a

esta parte que sobre os trabalhadores

do Estado pesa o falso ónus das mordomias

adquiridas, da mandriagem

e da incompetência. Um estigma.

Mandriões e incompetentes haverá,

por certo, alguns. Como também os

encontraremos no setor privado. Ou

onde quer que seja. A generalização

da nódoa a todo o tecido público é que

não parece certa. Até porque tantos e

tão bons exemplos não faltam. Quem

se poderá esquecer, por exemplo, da

realização, já este ano, do Festival de

BD de Beja, na Casa da Cultura, apenas

com a boa vontade de quem lá

trabalha? Ou quem não se orgulha

do esforço desmedido dos profissionais

da Biblioteca de Beja para, sem

um tostão, levantarem mais uma edição

das Palavras Andarilhas? Sem

reclamarem horas extraordinárias,

benefícios adicionais e, fundamentalmente,

sem receberem subsídio de férias,

nem de Natal.

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