Editorial
15/9
Paulo Barriga
Os algarismos em cima representam
uma data. À
qual falta apenas juntar o
ano: 2012. Uma data histórica, esta.
A data em que a nova maioria silenciosa
saiu à rua. Em Portugal.
Em muitas cidades de Portugal.
Em Beja, também. Na praça da
República. Por onde foram passando,
ao longo da tarde de sábado,
perto de um milhar de pessoas.
Anónimas, isoladas, desalinhadas,
despartidarizadas. Mas com
um simples objetivo comum: o de
quererem as suas vidas de volta.
Apenas isso. Não terão sido muitos,
os manifestantes. Qualquer organização
partidária ou sindical seria
certamente capaz de juntar ali,
em menos de um farelo, o dobro
ou o triplo das pessoas. A gritarem
a uma só voz uma qualquer palavra
de ordem previamente estabelecida.
Enquanto estes, os “desconhecidos”
que se juntaram em
Beja, não. Não combinaram dizeres
entre si. Não ajustaram os discursos.
Não concertaram as suas
ações. E por isso mesmo, o dia 15
representa um marco histórico
para a democracia portuguesa.
Porque no meio da praça, das muitas
praças de Portugal, havia apenas
pessoas. Pessoas que expressaram
o seu sentimento de revolta.
Cada qual, livremente, partilhou
com os restantes a sua experiência
pessoal, a sua indignação, o seu estado
de alma. E não há nada mais
perigoso para o sistema, para todos
os agentes que o preservam a
qualquer preço, do que a palavra
indomável. A palavra sentida e livre
e insubmissa. A vontade própria.
O livre arbítrio. As democracias,
tal como as conhecemos, não
estão preparadas para a pluralidade
de ideias. Verdadeiramente.
É um paradoxo insanável: o sistema
que deixa as pessoas votarem
em alguns, não gosta da palavra
de todos. Talvez porque as
palavras doam muito mais do que
as cruzes que se riscam de quatro
em quatro anos num quadradinho
de papel. Talvez porque as palavras
digam muito mais do que as sondagens
encomendadas. Talvez porque
as palavras ainda não paguem
imposto e não possam ser sujeitas
à austeridade. Essa sim, a austeridade,
uma palavra própria da arrogância,
do poder autoritário, das
ditaduras. Ainda que modernas e
disfarçadas de cordeiro. As ditaduras.
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