quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Diário do Alentejo Edição 1587

Editorial


15/9

Paulo Barriga

Os algarismos em cima representam

uma data. À

qual falta apenas juntar o

ano: 2012. Uma data histórica, esta.

A data em que a nova maioria silenciosa

saiu à rua. Em Portugal.

Em muitas cidades de Portugal.

Em Beja, também. Na praça da

República. Por onde foram passando,

ao longo da tarde de sábado,

perto de um milhar de pessoas.

Anónimas, isoladas, desalinhadas,

despartidarizadas. Mas com

um simples objetivo comum: o de

quererem as suas vidas de volta.

Apenas isso. Não terão sido muitos,

os manifestantes. Qualquer organização

partidária ou sindical seria

certamente capaz de juntar ali,

em menos de um farelo, o dobro

ou o triplo das pessoas. A gritarem

a uma só voz uma qualquer palavra

de ordem previamente estabelecida.

Enquanto estes, os “desconhecidos”

que se juntaram em

Beja, não. Não combinaram dizeres

entre si. Não ajustaram os discursos.

Não concertaram as suas

ações. E por isso mesmo, o dia 15

representa um marco histórico

para a democracia portuguesa.

Porque no meio da praça, das muitas

praças de Portugal, havia apenas

pessoas. Pessoas que expressaram

o seu sentimento de revolta.

Cada qual, livremente, partilhou

com os restantes a sua experiência

pessoal, a sua indignação, o seu estado

de alma. E não há nada mais

perigoso para o sistema, para todos

os agentes que o preservam a

qualquer preço, do que a palavra

indomável. A palavra sentida e livre

e insubmissa. A vontade própria.

O livre arbítrio. As democracias,

tal como as conhecemos, não

estão preparadas para a pluralidade

de ideias. Verdadeiramente.

É um paradoxo insanável: o sistema

que deixa as pessoas votarem

em alguns, não gosta da palavra

de todos. Talvez porque as

palavras doam muito mais do que

as cruzes que se riscam de quatro

em quatro anos num quadradinho

de papel. Talvez porque as palavras

digam muito mais do que as sondagens

encomendadas. Talvez porque

as palavras ainda não paguem

imposto e não possam ser sujeitas

à austeridade. Essa sim, a austeridade,

uma palavra própria da arrogância,

do poder autoritário, das

ditaduras. Ainda que modernas e

disfarçadas de cordeiro. As ditaduras.

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