Editorial
Equívocos
Paulo Barriga
O presidente da empresa
pública Estradas
de Portugal acha que a
construção da autoestrada entre
Beja e Sines é “mais um equívoco
técnico”. Porque é uma obra
muito cara. E porque “numa
perspetiva realista” por lá passariam
apenas dois carros a cada
minuto. Vai daí, acaba-se de vez
com o equívoco e “poupa-se” ao
Estado qualquer coisa como 338
milhões de euros. O deputado
Mário Simões concorda plenamente.
Esta autoestrada, diz ele,
é um “capricho” desadequado à
nossa realidade. E a sua construção
parte de um “raciocínio que
tem tanto de pobre como de perigoso”.
Aliás, a “dimensão de tal
embuste” deve levar os responsáveis
pela ideia, com José Sócrates
à cabeça, a sentarem-se no banco
dos réus. O engraçado da questão
é que o embuste, o capricho e o
equívoco apenas foram detetados
agora. Quando parte considerável
da obra está no terreno. Das
primeiras coisas que um bom pai
ensina a um filho é que deve comer
a sopa até ao fim. Não só porque
o fortalece, como o desperdício
é coisa muito feia. É quase
tão feia como cuspir na própria
sopa. E o que este Governo nos
vem dizer agora é que o desperdício
não é assim tão mau quanto
isso e que, por vezes, é necessário
dar uma boa cuspidela. Foi o que
fizeram. É o que têm feito os sucessivos
governantes de Portugal
em relação à nossa região. Cuspir.
Cuspir sobre todos os nossos
equívocos. Foi assim, durante
décadas, com a barragem
de Alqueva, cujo financiamento
para concluir o projeto, equivocamente,
ainda não está garantido.
Foi assim com o desmantelamento
das vias ferroviárias de
Moura e da Funcheira e com o
fim da ligação direta a Lisboa. Foi
assim com o aeroporto de Beja.
Foi assim com a autoestrada, essa
“imbecilidade”. Cuspir. Mas só
foi assim porque o Alentejo não
tem escala em termos de votos.
E porque o Baixo Alentejo sempre
se equivocou quando elegeu
os seus deputados pelos partidos
que acabaram no Governo. Não
temos voz lá em cima. Não temos
dimensão cá em baixo. Estamos
tramados como sempre estivemos.
Estamos equivocados como
sempre estivemos. Estamos sós
como sempre estivemos. Mas vamos
salvar o País poupando uma
ninharia ao mesmo Estado que
construiu três autoestradas entre
Lisboa e o Porto. Estamos a
ser comidos por parvos como
sempre fomos. Não se sabe é até
quando é que seremos pacientes
com esta gente como temos sido.
A paciência, a nossa resignação,
parece estar por um fio. Estarei
equivocado?
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