Editorial
À deriva
Paulo Barriga
O PSD e o CDS, na sua incansável
e persistente
empreitada de deitar
abaixo o edifício do Estado, fizeram
aprovar na Assembleia
da República a Lei 22/2012. Não,
estimado leitor, não se trata de
qualquer tipo de iniciativa que
vá ao bolso do povo, como é costume,
ou que tenha reflexo nas
contas públicas. Trata-se da chamada
reorganização administrativa
territorial autárquica. O
tal diploma que, até ao final do
ano, pretende extinguir cerca de
um milhar de freguesias portuguesas.
Não fosse tão séria e desonesta
e obscena, esta lei até
poderia ser motivo para galhofa,
palhaceira que ela é na sua essência.
Num qualquer gabinete
de Lisboa, meia dúzia de tecnocratas
iluminados andam neste
momento de regra e esquadro
na mão a reinventar o mapa de
Portugal. Cortando aqui, juntando
acolá, sem terem qualquer
tipo de sentimento de solidariedade
ou de justiça, principalmente
em relação às freguesias
do interior. Pensarão eles, se é
que se pode chamar “pensar”
ao atentado que estão a cometer,
que as freguesias de Santo
Aleixo da Restauração ou de
Gomes Aires são entidades supérfluas
e dispendiosas. De salientar,
em primeiro, que mais
esta medida que a troika impôs
ao País, para além de parva,
implica apenas 0,1 por cento
do Orçamento de Estado. Uma
verba tão insignificativa que
só em certas mentes perversas
paga ou justifica o abandono,
o empobrecimento e o desconsolo
que trará às freguesias rurais
a extinguir. Já de si pobres,
desconsoladas e abandonadas.
Agrupar duas ou mesmo três
freguesias nas grandes cidades
até pode ser uma medida aceitável.
Mas fulminar freguesias
em locais envelhecidos, onde as
pessoas não têm meios financeiros,
nem saúde, nem transportes
para se deslocarem é um crime
hediondo. Isto sem contar com o
papel fundamental que estas entidades
desempenham ao nível
da assistência social de proximidade,
ao nível da resolução dos
problemas imediatos das populações,
ao nível da humanização
das relações de vizinhança.
Primeiro fecharam os postos da
GNR, depois fecharam as escolas
primárias, hoje fecham as
juntas de freguesia… Amanhã
fecham as próprias aldeias. E
Portugal, cada vez mais concêntrico,
litoralizado, prosseguirá
à deriva rumo ao abismo. Isto
se nós não tomarmos conta do
leme ou não colocarmos o arrais
na linha, claro.
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