quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Diário do Alentejo Edição 1600


Editorial
Benvinda
Paulo Barriga
Estas linhas foram escritas
na quarta-feira. Há uma
probabilidade muito remota,
quase tão remota como a
profecia que alerta para que hoje
mesmo o mundo acabe, que elas
fiquem apenas para mim. Pelo
sim e pelo não, penso regá-las
amanhã, quinta-feira, as palavras,
com um tintol abaladiço.
Pois quem nos pode afiançar, ao
certo, se hoje cá estaremos. Como
parece que estamos. E já que cá
estamos, como é provável que estejamos,
gostaria de vos anunciar
oficialmente o fim do mundo. Não
como a civilização Maia o vaticinou
há quatro ou cinco mil anos
atrás, mas como os nossos olhos o
veem abalar a cada dia que passa.
O mundo, o planeta Terra, é velho
que se farta. E envelhece que se
farta. Todos os dias. Como todos
nós envelhecemos que nos fartamos
desde o exato momento em
que nascemos. As coisas, o mundo
também é coisa e os homens também
são coisas, envelhecem. É
esse o mistério da vida, dirão em
Roma. É esse o desespero da existência,
diriam os velhos alquimistas.
É essa a verdadeira fome de
viver, dirá em rima qualquer poeta
mediano. O mundo poderá estar
prestes a acabar. Talvez esteja.
Mas antes que acabe, acabemos
nós, dentro das nossas possibilidades,
à nossa ínfima escala, com
o que está a acabar com ele, com
o mundo. E este é o voto de Natal,
sincero e sentido, que o “Diário do
Alentejo”, toda a sua equipa, deseja
aos seus leitores, aos seus assinantes,
aos seus anunciantes, aos
seus amigos. A todos os que nos
leem e que não leem. Ao próprio
mundo. Pois cada instante que
restar, ao mundo e a nós próprios,
será irrepetível. Estupendamente
irrepetível. Admiravelmente irrepetível.
Acho que é isto que querem
dizer as pessoas que gostam
de afirmar que o Natal deveria ser
todos os dias. O Natal, visto assim
de esguelha, sem negócio nem
peru, é todos os dias. Apenas não
nos damos conta dele, sempre um
nadinha mais velhos que vamos
estando ou ficando. Na quarta-
-feira escrevi estas linhas como
se fossem as últimas. Na terça, a
minha filha mais nova ficou mais
velha dois anos desde que começou
a gostar de respirar a atmosfera.
Ontem, que foi quinta, acho
que reguei estas palavras com um
belo tintol. Hoje, que o mundo
acaba, estou mesmo contente
por estarmos, eu e você, a ler estas
palavras em conjunto. É assim
o Natal, todos os dias, até ao
último dia. Dedico esta crónica e
este Natal por inteiro a Benvinda
Paulino. Que soube partilhar cada
instante da sua vida como se fosse
o último. Como se fosse único. E
irrepetível.

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