quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Diário do Alentejo Edição 1661

Editorial
Luzinhas
Paulo Barriga

É giro passear no frio do
lusco-fusco pelas ruas
das cidades e das vilas
que estão iluminadas pelas
grinaldas de luzes natalícias.
Há qualquer coisa de
primitivamente social nesses
passeios. Qualquer coisa que
atinge as pessoas. Qualquer
coisa que estimula o lóbulo
cerebral que é responsável
pela simpatia. Há qualquer
coisa, de facto. As luzinhas de
Natal costumam ser servidas
na panela da política. Quando
chegam, nunca falta quem as
considere um investimento
descabido em tempos de crise.
Um golpe de verdadeira demagogia
eleitoralista. Um
gasto desnecessário em auxílio
do comércio tradicional,
que está morto e enterrado
com ou sem luminária festiva.
Mas, lá bem no fundo, não há
quem não se deixe levar por
elas. Pelas luzinhas. Que nesta
quadra funcionam para as localidades,
como funcionou a
estrela do Oriente para o palheiro
de Belém: Conduzem
os perdidos para o seu centro.
E é no centro das terras que as
pessoas se encontram com as
suas próprias terras e que se
encontram com elas próprias.
Com vagar. Com disponibilidade.
Veja-se, por exemplo, o
caso de Beja. Habitante do subúrbio,
frequentador de bica
escaldada do café da esquina,
dono e bom amigo do labrador
que faz cocó à porta do
vizinho e que ladra o dia inteiro
possesso pela solidão da
varanda, o bejense costuma
sentir-se um estrangeiro na
sua própria terra. E porquê?
Porque há uma fronteira de
preguiça e de resignação entre
a última casa do bairro e
a primeira pedra da calçada
da cidade velha. Transpô-la,
principalmente a pé, é um
ato desnecessário e cansativo
e démodé. Hoje, tudo quanto
o bejense necessita está dentro
dos grandes prefabricados
que existem por detrás
da mata dos alemães, junto à
estrada variante. E é lá, sob a
chuva dos bons preços assinalados
em cartazes que estão
dependurados por fios de
pesca sobre a sua cabeça, que
o bejense gosta de se encontrar
consigo e com os outros.
Rápida e neuroticamente.
Entre os congelados e as papas
para bebé. Sem tomar atenção
aos risinhos cínicos dos novos
agiotas. Rezam as crónicas
da velha palestina que a
História da Humanidade mudou
muito desde então, mas
que ela não se fez propriamente
nos Templos. E muito
menos se escreveu pela pena
dos vendilhões.

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