Editorial
Jornais
Paulo Barriga
Não há quem goste de saber
das notícias que
se importe de sujar a
ponta dos dedos logo pela manhã
com as folhas acabadas de
sair do prelo. O jornal, ao contrário
do que acontece com os
restantes meios noticiosos, carrega
dentro de si um mundo inteiro.
Mas carrega-o como as
grávidas carregam os seus bebés.
Fisicamente. Verdadeiramente.
Vivamente. Carinhosamente. As
rádios, as televisões, os meios
eletrónicos dão-nos fotografias
do real. Muitas vezes em tempo
igualmente real. Imagens sonoras,
pedaços de movimento, interação,
até. Mas não nos dão a
vida. Essa existência de papel
que nos tinge os dedos e nos comove
no dia-a-dia. Trabalhosa
e operária e exigente. O jornal
da manhã não vale pelas notícias
que traz lá dentro, apenas.
Não vale pela atualidade que
nos meios mais imediatos está
em cada segundo a ser posta à
prova. Renovada a todo o instante.
Persistentemente. O jornal
da manhã, ainda novo na
banca, já é velho. Porque cresceu
tão rapidamente desde que
foi pensado, redigido, paginado,
produzido, impresso, distribuído,
o jornal nunca teve
nem nunca terá tempo para ser
jovem de verdade. E, por isso
mesmo, as pessoas tanto o respeitam.
Pelo menos por algumas
horas. O tempo exato que
separa a chegada ao quiosque
de nova fornada de papéis impressos,
untados de notícias e
de letras gordas, e a transformação
da empolgante manchete de
ontem na forra da gaiola do canário
ou a reabilitação de uma
entrevista exclusiva num amarrotado
para limpar os vidros. É
ingrata a vida das notícias dos
jornais. É ingrata porque é tão
naturalmente efémera quanto os
dias, os meses e as vidas inteiras
o são. E é por ser tão ingrata e
veloz a vida das notícias dos jornais
que elas nos são tão próximas.
Tão íntimas. É com elas
que acordamos e à espera delas
que nos deitamos. Sem qualquer
outro compromisso que não seja
o passar dos dias. Um após o outro.
Com o tempo que o tempo
tem. Simplesmente isso.
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