quinta-feira, 17 de abril de 2014

Diário do Alentejo Edição 1669

Editorial
21
Paulo Barriga


Havia um exercício dinâmico,
tipo trocadilho,
que se fazia antigamente
com os alunos da
primária para rir e para aferir
um poucochinho da sua
agilidade para a matemática.
Dizia-se: sete e sete e três dezassete
e quatro vinte e um, quantos
são? Mesmo os mais lestos
no cálculo mental depressa se
despistavam em multiplicações
mirabolantes seguidas de somas
improváveis. Embora o resultado
da brincadeira estivesse
mesmo ali à vista, no próprio
enunciado, escarrapachado.
Vinte e um. Precisamente o
mesmo número de alunos que
hoje são necessários para manter
em funcionamento uma escola
primária. Vinte e um. Nem
mais: sete e sete e três dezassete
e quatro vinte e um. Foi durante
o governo da tanga de Durão
Barroso, com David Justino a fazer
de Judas da educação, que o
PSD e o CDS reinventaram esta
fórmula cómica para ajudar a
despovoar o interior do País.
Sócrates deu-lhe ainda menos
giz e Coelho, com o apagador de
Nuno Crato, parece agora querer
deixar o quadro definitivamente
limpinho. Esta semana, o
ministro da Educação e Ciência
tornou a relembrar a dosagem
mágica para o próximo ano letivo:
vinte e um todos fora nada.
E cá está “mais um passo na melhoria
da escola pública”. Um
“passo” que vai fazer encerrar
perto de uma vintena de escolas
no distrito de Beja e de quase
duas centenas em todo o interior
de Portugal. Um “passo” em
frente na suposta remodelação
do ensino primário público. Mas
um “passo” atrás, extraordinariamente
grande e com pouca
volta a dar-lhe, na desertificação
das aldeias e das vilas e até de algumas
pequenas cidades situadas
nos chamados territórios de
baixa densidade. Não há maior
crueldade social do que afastar
compulsivamente as diferentes
gerações de uma micro comunidade.
Não há corte orçamental
ou melhoria pedagógica que tal
justifique. Nem nada que a tal
obrigue. Porque as crianças são
a alma de toda e qualquer sociedade.
Subtraí-las às suas terras
equivale a retirar a alma a esses
locais. Nem por acaso, costuma
dizer-se que vinte e um é o peso
da alma em gramas. O peso que
um corpo perde quando o sangue
deixa de ventilar os canais
pulmonares. O peso que se retira
à morte. É o que estas políticas
insensíveis e desumanas estão
a fazer ao interior do País:
estão a retirar-lhe a alma. O que
em gramas dá sete e sete e três
dezassete e quatro vinte e um.

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