domingo, 7 de setembro de 2014

Diário do Alentejo Edição 1689

Editorial
Reformas
Paulo Barriga

Reforma. De entre o escasso
léxico governativo, este é o
vocábulo que mais está na
berra. Tudo neste País é reformável,
a começar pelas próprias pensões
de reforma. O território carece de
reforma. O ensino também carece.
A saúde, os transportes, a justiça…
O próprio Estado. Reformar é o
verbo do tempo presente. Predicado
de feição regular que apenas parece
não ajustável ao sistema bancário,
às grandes fortunas e ao próprio
Governo da Nação. Esta segunda-
-feira avançou a reforma do sistema
judiciário português. Quem
não estará de acordo com a introdução
de mudanças, profundas e
eficazes, que melhorem o funcionamento
dos tribunais? Mudanças
que tornem a justiça mais célere,
alargada, mais próxima de todos os
cidadãos? Mais justa, passe o pleonasmo?
Aliás, o próprio conceito de
“reforma”, na sua boa significação,
obriga a remodelações, mas também
a melhoramentos. O que, de
facto, não se verificou nas mudas
que o Ministério da Justiça aplicou à
reorganização dos tribunais. A barafunda
é de tal forma invulgar que
a própria Ordem dos Advogados
decidiu apresentar uma queixa-
-crime contra os governantes que
assinaram a dita reforma, por atentado
contra o Estado de Direito. Em
boa verdade, são os próprios magistrados
que, de ombros encolhidos,
alertam para o facto de existirem
processos espalhados por todo
o lado. Escassez de funcionários.
Problemas na plataforma informática
da justiça. Falta de privacidade
e de resguardo para o exercício
da profissão. No distrito de Beja,
a “reforma” liquidou todas as comarcas
até aqui existentes, transformando
esses tribunais em extensões
da super comarca de Beja (o de
Mértola passou a mera secção para
consulta de papelada). Com a agravante
de todos os processos-crime
cuja moldura penal exceda os cinco
anos se concentrem igualmente na
capital de distrito. O mesmo acontecendo
com as iniciativas cíveis em
que os pedidos de indemnização ascendam
aos 50 mil euros. Isto para
nem falar do facto de ainda não
ter sido encontrado um local apropriado
para instalar o Tribunal de
Família e Menores, que começará a
laborar precária e provisoriamente
em Ferreira do Alentejo. O que vai
acontecer, em bom rigor, é que a
grande maioria dos processos vão
afunilar em Beja, tornando a sua resolução
mais lenta, alargando ainda
mais as distâncias entre as pessoas
e os tribunais (que o digam os munícipes
de Odemira ou Barrancos),
cavando mais uns bons palmos na
cova funda que afasta cada vez mais
as populações da periferia dos grandes
centros. Quando ouvir algum
ministro falar em “reforma” tenha
medo, muito medo.

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