sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Diário do Alentejo Edição 1690

Editorial
Jihad
Paulo Barriga

O Al Andaluz, que equivale,
mais coisa menos coisa,
ao território da Península
Ibérica, faz parte dos planos estratégicos
da jihad global. Parece uma
brincadeira de mau gosto. Mas não
é. A ameaça é recente. É real. E tem
cada vez mais apoiantes nas extensões
magrebinas do autodenominado
Estado Islâmico (EI). O próprio
ministro espanhol do Interior
já reconheceu publicamente que
as intimações que circulam na
Internet são para levar a sério.
Muito a sério. É certo que ninguém
esperará um desembarque jihadista
nas praias de Espanha ou do
Algarve. Mas alguns especialistas
citados pela imprensa internacional
acreditam que o EI está em condições
de atentar contra a Europa e
os Estados Unidos nos próximos
meses. Sendo que “a terra dos nossos
avós”, como eles a prenunciam,
consta na carta de intenções dos
terroristas. O que não deixa de ser
patético. É certo que o grande objetivo
militar e político do “califa”
Aboubakr el Bagdadi é içar a bandeira
negra em Damasco e Bagdad.
O problema é que no próximo
oriente existem hordas dos chamados
“lobos solitários”. Jovens radicais,
em autogestão, que estão dispostos
a fomentar a “guerra” por
conta própria. Não uma guerra
qualquer. Convencional. Mas uma
guerra em nome do mito do paraíso
perdido. O Al Andaluz, enquanto
espaço geográfico, não lhes
interessa propriamente. Interessa-
-lhes, outrossim, a lenda de uma
grande civilização muçulmana,
unitária e alternativa ao culto do
Ocidente. De facto, os tempos áureos
do Al Andaluz representam,
de alguma forma, isso mesmo.
O multiculturalismo. A tolerância.
O livre pensamento. A descoberta.
A ciência e as artes. E é precisamente
esse legado formidável e
tão formidavelmente recuperado
pelo professor António Borges
Coelho. Tão intenso e tão intensamente
escavado pela equipa de arqueólogos
de Cláudio Torres. Tão
vibrante como os poemas de Al
Mutamid que Adalberto Alves juntou
no seu árabe coração, é esse legado
que não condiz com a pilantragem
que se propõe reconquistar
o Al Andaluz com bombas atadas
ao peito. O bom caminho, aliás, é
o da Destruição da Destruição.
Que é um título de um livro do médico
e filósofo Averróis, nascido em
Córdoba no século XII. Um pensador
que acreditava na coexistência
de mais do que uma verdade para
uma mesma leitura. Em suma, será
que é desta liberdade interpretativa
e intelectual que falam os “lobos
solitários” quando se propõem
libertar o Al Andaluz? Ou preferirão
apenas servir em bandejas berberes
mais algumas cabeças decepadas?
Esta gente não é digna do
seu próprio passado. E muito menos
da terra dos seus avós.

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