sábado, 11 de outubro de 2014

Diário do Alentejo Edição 1694


Editorial
Implosão
Paulo Barriga

Afinal ele faz falta. O 5 de
Outubro faz a falta que
sempre fez. A celebração
da República faz falta. Pelo menos
a recordação dos seus ideais
mais íntimos e, reconheça-se,
nunca verdadeiramente exibidos
em Portugal. E isto não é apenas
uma questão de mendigar mais
um dia de folga. Mais um feriado
lampeiro. Nada disso. O 5
de Outubro faz tanta falta à política
pátria, como tanta falta faz
uma pinguinha de dignidade
à própria política pátria. Uma
pontinha de decoro. Um poucochinho
de vergonha na cara.
Ou seja: tudo aquilo que faltou
ao discurso de Cavaco Silva. No
dia 5 de Outubro. Esse dia que
tanta falta afinal faz. Num eficaz
golpe de ilusionismo, ou de
escapismo, disse o Presidente
que o sistema partidário corre o
risco de implodir. Melhor: disse
que os políticos constroem a
vida no carreirismo e que esse
oportunismo é fundado no interior
dos próprios partidos.
Ainda melhor: disse que os políticos
incumprem por sistema
as suas promessas e que a coisa
pública está a descambar para a
demagogia e para o populismo.
O que Cavaco Silva não disse ou
não se lembrou de dizer ou não
quis dizer de todo foi a responsabilidade
que o próprio tem no
estado implosivo a que isto chegou.
Carreirismo. Oportunismo.
Demagogia. Populismo. É à escolha
do freguês. Nem por
acaso, a 5 de Outubro deu-se
a fundação de um novo partido.
O Partido Democrático
Republicano. Cujo preceptor, o
talvez eurodeputado Marinho
e Pinto, repetiu com abastada
coincidência as palavras demolidoras
de Cavaco Silva. Disse o
ex-bastonário que não larga o
bastão, como se Cavaco o fosse
e dissesse, que estamos a trilhar
o caminho do suicídio coletivo.
Que os políticos estão ao serviço
das suas clientelas. Que os partidos
são parasitários por definição.
Não deixando, no entanto,
de formar mais um partidozeco.
Igualzinho a todos os outros.
Com os mesmos explosivos
e detonadores atados à cintura,
segundo a definição de Cavaco
Silva. Deram-se estes casos a 5
de Outubro. Um dia que tanta
falta faz. Nem que seja, por estes
tempos, para alegrar a malta a
toque da caixa da hipocrisia e da
tuba da sonsice. Já agora que a
banda fanfa da política vai a passar
na rua: quando se lembrarem
de implodir a coisa, de vez, rijamente,
avisem. E não se esqueçam
de estar dentro do edifício
que vai abaixo. Como verdadeiros
mártires. O povo aludirá às
vossas memórias. Nem que seja
numa boa piada. Talvez de alentejanos.
Talvez…

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