sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Diário do Alentejo Edição 1698

Editorial
Sinalética
Paulo Barriga

Estes últimos tempos têm
sido cómicos no que diz
respeito às direções, à sinalética,
que a vida política leva.
Parece que os caminhos que antes
naturalmente se bifurcavam
hoje tendem a convergir. Com algum
descaramento, diga-se de
passagem. A esquerda. E a direita.
De há duzentos e tal anos
a esta parte, desde os tempos da
Revolução Francesa, que se reconhecem
com alguma garantia
dois blocos “ideológicos” na disputa
do osso político. Neste longo
período pós-napoleónico, as coisas
da esquerda e da direita, com
nuance aqui, nuance acolá, foram-
se consolidando na sociedade.
Na propaganda. No combate
partidário. Na cabeça das
pessoas. A esquerda (quem não
sabe?) é o hemisfério progressista
da teia política e ideológica.
Coletivista, igualitária, na senda
da justiça social. Uma massa popular
onde se encontram comunistas,
socialistas, ultimamente
algumas fações ecologistas. Já a
direita, tradicionalista, conservadora
por definição e credo, reacionária,
encaixa na sua “filosofia
da liberdade individual”
os partidos ditos populares, democratas
cristãos e todos os estilhaços
dos novos e dos antigos
fascismos. Bem sei que os enunciados
atrás deixados são leves,
incompletos e muito mutilados.
Mas nada disso importa quando
queremos encontrar hoje, e não
conseguimos, fundamentos ideológicos
para a definição de esquerda
e de direita. Porque a própria
ideologia entrou em falência,
em processo de extinção, desde a
vitória global do capitalismo financeiro
e do liberalismo económico.
Selvagens, os dois. E o
único espaço de contenda onde
ainda se podia vislumbrar o espectro
de uma certa esquerda
e de uma dita direita, o Estado,
também se esfumou. Pelo menos
no que toca ao armário onde
a direita costumava guardar o
esqueleto de um Estado pequenino,
com as estruturas básicas
e fundamentais ao seu funcionamento
privatizadas e nas
mãos da supostamente autorregulada
e sapiente economia de
mercado. Ora, se tivermos como
válida a sinalética que a vida política
leva, apenas podemos desatar
a rir a bandeiras despregadas.
Escutar nomes como Freitas do
Amaral, Silva Peneda ou Bagão
Félix a defender a nacionalização
de empresas privadas como a PT,
em nome do interesse nacional,
é isso mesmo que dá: vontade de
rir. Ou eles não têm noção do ridículo.
Ou os fundamentos da direita
e da esquerda já apenas não
trocam o passo debaixo dos tacões
das botas da tropa: um-dois,
esquerda-direita.

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