sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Diário do Alentejo Edição 1700

Editorial
Coisas
Paulo Barriga

Ele há coisas que não lembram
ao demónio. Lembrar,
às vezes lembram. Mas ele
há coisas que a gente nem se quer
lembrar de se lembrar. Quem se
atreveria de lembrar, se não o vermelhuço,
que parte substancial da
torre alta do castelo de Beja iria
tombar? Lagarto, lagarto, lagarto!
Quem ousaria lembra-se de mandar
17 pessoas para o hospital por
causa de um inseticida marado
qualquer e, dois dias depois, repetir
a gracinha? Nem o demo! Quem,
de bom senso, nos dias que correm,
teria a lembrança de meter um hospital
nas mãos de privados, ainda
para mais argumentando poupanças
e melhoramentos, ao mesmo
tempo? Nem o chifrudo! Mas tudo
isto aconteceu numa das semanas
mais enxofradas de que há memória
nesta terra maninha. Pelo fim:
O Ministério da Saúde andou-andou
e lá passou para as mãos da
Santa Casa da Misericórdia de
Serpa o Hospital de São Paulo. O argumento
é dois em um: O Estado
poupa 25 por cento com a transferência
e, do outro lado, a Santa
Casa aumenta e melhora os serviços
de saúde a prestar à população.
Fantástico! Baseado, por certo, nos
bons exemplos de gestão das parcerias
público-privadas e nas exemplares
administrações das antigas
empresas públicas, o Governo encontrou
em Serpa a solução para os
seus desvarios orçamentais. Caiu
na tentação. Fazer mais, melhor,
com menos dinheiro, sem redução
de pessoal e sem que sejam os doentes
a pagar a brincadeira? Esta
é mesmo dos diabos! Pelo meio: O
belo e edificativo modelo de gestão
privada que é a PT, e que o Estado
passou igualmente à pressa para as
milagrosas mãos de privados, tem
em Beja um centro de atendimento
telefónico. Ao que se diz, trabalham
lá dentro para cima de trezentas almas.
Ao que se diz, trabalhar não é
bem o verbo aplicável aos trabalhadores
sub-sub-subcontratados da
PT. Talvez, esfolar. Ao que se disse
no sábado passado, andaram para
lá a matar os piolhos dos pombos e
quase matavam 17 trabalhadores.
Ao que se disse na segunda-feira,
andaram para lá a matar os piolhos
dos pombos e quase matavam 40
trabalhadores. Ao que se costuma
dizer em Portugal nestas situações,
vai-se abrir um inquérito. Ao que
se sabe como acontece nestas situações:
A culpa vai morrer solteira.
Pelo início: Como solteira morrerá
a culpa sobre o estado de deterioração
a que chegou o castelo de Beja.
Aliás, culpa é um valor demasiadamente
católico para a pira demoníaca
onde Portugal arde. Um Estado
que não cuida do que é comum,
como em Serpa, que deixa maltratar
cidadãos, como na PT, e que
deixa desmoronar a sua história,
como no castelo, não é um Estado,
é uma divina comédia. Cruzes, canhoto!

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