sábado, 21 de março de 2015

Diário do Alentejo Edição 1717

Editorial
Freguesias
Paulo Barriga

O poder central não costuma
gostar das freguesias.
Aliás, o poder central costuma
ser contra a existência das freguesias.
Essa aversão tornou-se mais
evidente em 2013 com a dita reforma
do mapa administrativo. Que exterminou
por implosão ou por justaposição
1169 freguesias. Mas este é
apenas o lado raivoso da questão. A
mordidela canina nas canelas da soberania
popular. Porque não é de subestimar
a permanente ameaça que
paira sobre as freguesias. O constante
ladrar furibundo dos mastins.
Sempre tentados a atacar. E percebe-
-se muito bem o porquê desta ânsia
canina. As freguesias são a unidade
atómica do território. É nelas, e apenas
nelas, que a cidadania se exerce.
De facto. Como é nelas, e somente
nelas, que a soberania popular tem
expressão. É claro que isto de manter
o poder junto dos cidadãos, descentralizado,
soberano, legítimo,
constitucionalmente reconhecido, é
um problema. Um problema acrescido
pelo facto de os fregueses terem
opinião e, mais do que terem
opinião, terem a faculdade de a expressarem
no ceio do aparelho de
Estado. É verdade, por muito que se
queira amesquinhar o papel das freguesias,
elas são o reduto democrático
da descentralização administrativa
e o derradeiro bastião dos
direitos fundamentais dos cidadãos.
Uma das principais detrações que o
poder central costuma lançar sobre
as freguesias tem a ver com os compadrios
que o poder de vizinhança
pode gerar, com o nepotismo, com as
relações menos claras ou derrapantes
entre eleitos e eleitores. Quem no
Governo, em todos os governos, fala
assim, sabe do que fala. Basta olharmos
para as páginas dos jornais.
Não há dia em que não apareçam
em letras gordas as palavras corrupção,
favorecimento, peculato…
Aplicadas precisamente àqueles que
costumam apontar os podres às freguesias
e ao poder local em geral. É
evidente que não há bela sem senão.
Mas se formos observar os casos de
polícia envolvendo eleitos ou ex-eleitos
em Portugal, não restarão margens
para dúvidas sobre quem anda
a meter a mão na massa neste País. O
poder central não gosta das freguesias
porque, afirmam alguns governantes,
são um sorvedouro de recursos.
Mas enquanto a dívida do País
engorda que nem um bacorinho no
Terreiro do Paço, os compromissos
financeiros das autarquias, em geral,
e das freguesias, em particular,
vão secando como as uvas passas.
Isto apesar das novas competências
que lhes são atribuídas e dos cortes
orçamentais cegos que têm sofrido
nos últimos quatro anos. Período
em que o poder central desistiu dos
portugueses e em que o poder local
deles tomou conta. E isto deve irritar
alguns governantes. Principalmente
aqueles que já não costumavam gostar
das freguesias.

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