sexta-feira, 17 de abril de 2015

Diário do Alentejo Edição 1721

Editorial
Identidade
Paulo Barriga
A par de “território”, “identidade”
é a palavra de ordem
dos tempos que correm.
Na verdade, território e identidade
são grandezas inseparáveis,
embora nem sempre coincidentes.
Veja-se o caso de Portugal que tem
o território continental consistente
desde a Idade Média, mas que, em
termos identitários, acaba por ser
uma realidade recente, talvez nem
ainda hoje totalmente consolidada.
E essa ausência de um corpo
identitário comum, forte e abrangente,
diferenciador mas não folclórico,
é, talvez, o grande motivador
do atraso congénito de que
o País padece. O grande promotor
das assimetrias regionais insanáveis.
O grande causador da litoralização
das atividades humanas
e da desertificação dos territórios
interiores. Com facilidade se dirá
que Portugal tem língua e gramática
comuns ao seu todo geográfico
e que esse é o maior polo gerador
de identidade de um povo. É verdade!
Mas não basta. A compartilha
das ferramentas linguísticas
possibilita a comunicação. Mas se
a necessidade nos diz que podemos
comunicar, já a prática nos ensina
que o entendimento da mensagem
nem sempre acontece. É o que se
passa, por exemplo, no exercício
centralizado do poder. Os nossos
governantes aparentam saber da
existência de um País. Vemo-los
circular pelas serras e planícies
em tempo de eleições. Ouvimo-
-los prometer coisas sensatas apenas
nessas alturas. Sentimo-los
próximos e compreensivos e sensíveis
em campanha. Mas, na verdade,
toda a comunicação eleitoral
é apenas ruído. O político eleitoral,
para lá da amnésia que o toma de
forma aguda após os escrutínios,
olha mas não vê. Ouve mas não escuta.
Fala mas não diz. Finge conhecer
mas não compreende. E
não compreendendo, não dizendo,
não escutando, não vendo, o governante
pós-eleitoral, como acontece
de forma gritante quando toca ao
Alentejo, esquece. Apenas assim
se compreende o estado de abandono
a que chegou a região. Um
território pouco abonado em votos
nas urnas, é certo. Mas que hoje é
o destino turístico nacional por excelência,
cujos valores identitários
são reconhecidos internacionalmente,
cuja riqueza agrícola é incomparável,
cuja abastança mineral
é inigualável, cujo litoral junta,
harmoniosamente, o paraíso ambiental
e paisagístico com a grande
indústria marítima. O Alentejo,
porque tem uma identidade muito
própria na era do apagão global,
parece que cria urticária a quem
governa do centro para a periferia.
A quem sempre valoriza os números
por oposição à coisa humana. A
quem, em alturas bem específicas,
vem às aldeias, mas não tem capacidade
para ver as casas.

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