sexta-feira, 19 de junho de 2015

Diário do Alentejo Edição 1730

Editorial
Jornais
Paulo Barriga

A realidade é esta: o consumo de
jornais impressos em papel está
pelas ruas da amargura. Em termos
genéricos, as vendas em banca baixaram
drasticamente, as subscrições de
fidelização pura e simplesmente desapareceram,
a publicidade disseminou-se
por uma verdadeira plêiade de novos suportes
e plataformas. Em Portugal, com
uma ou duas exceções, as publicações
de abrangência nacional são deficitárias
tanto em receitas, como em audiências.
E o mais grave é que as previsões não auguram
um futuro nada animador para o
setor. As causas para esta quebra de consumo
de jornais são múltiplas. Desde as
profundas mudanças culturais e sociais
ao nível do consumo de conteúdos informativos,
provocadas pela revolução tecnológica
mundial, até à crise económica
e financeira global. Mas existem outras
razões, porventura menos evidentes,
que estão igualmente a comprimir a imprensa
escrita no torno da falência. E essas
têm mais a ver com motivos internos
aos próprios jornais do que propriamente
com os públicos. Em primeiro lugar, os
jornais tradicionais reagiram tarde e da
pior forma à deslocação de públicos para
as plataformas digitais. E quando quiseram
correr atrás do prejuízo, abriram
as portas à maior das aberrações: a disponibilização
gratuita de conteúdos na
Internet. Esta medida, precipitada pela
tentativa tardia de cativar o maior número
possível de “seguidores”, criou hábitos
de “consumo livre” de informação
que dificilmente serão reversíveis. Já na
infância costumamos dizer que quem dá
e depois tira vai parar ao inferno. Para lá
do mau princípio da gratuitidade da informação
no mundo virtual, esta prática
generalizada está a ter um efeito bastante
pernicioso ao nível das redações. O jornalista
ético, em quem o leitor depositava a
sua confiança na mediação entre o acontecimento
e a notícia, passou ele próprio a
ser um produtor de conteúdos de leitura
rápida e muitas vezes imediata, pouco
ponderada, ligeira. Logo, as salas de redação
especializaram-se na superficialidade,
desagregaram-se e começaram a
ser compostas por mão-de-obra barata e
mal preparada. As consequências desta
quebra do acordo ancestral de confiança
entre o jornalista e o recetor da notícia estão
à vista. A franca qualidade do material
impresso, que imediatamente é disponibilizado
à borla na Internet, está a
dissuadir cada vez mais os leitores do jornal/
papel e a transformar os periódicos
numa mera pasta de árvores mortas, ao
mesmo tempo que a diversidade de olhares,
a análise, a investigação e a profundidade
se vão perdendo. Como se vai deteriorando
também a qualidade da vida em
sociedade e a própria democracia. Talvez
esta até seja uma visão pessimista da atualidade
jornalística. Mas não fatalista.
Penso que o futuro dos jornais impressos
passa essencialmente pelo regresso à
qualidade, às pessoas e especialmente aos
territórios culturais e sociais. Hoje, a imprensa
local e regional, no seu todo, tem
muito mais audiências e receitas do que
o conjunto dos jornais de tiragem nacional.
O que nos indica que, afinal, os jornais
até têm futuro. E que o futuro poderá
e deverá passar por aqui.

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