sexta-feira, 26 de junho de 2015

Diário do Alentejo Edição 1731

Editorial
Abalar
Paulo Barriga

A falta de solidariedade territorial
deste Governo é confrangedora.
Quando passar esta
maré má, este tumultuoso tsunami, o
que restará de Portugal será um país
absolutamente litoralizado, enfraquecido
e destroçado quanto à sua diversidade
e pluralidade. A suposta reforma
dos mapas escolar, judicial e
administrativo, onde imperou apenas
a cega aritmética da austeridade,
são o exemplo acabado da indiferença
governativa face às regiões periféricas,
já de si acossadas pela fragilidade dos
seus tecidos económicos e empresariais.
Desinteressando-se o Estado de
parte significativa do seu território,
da sua integralidade, nas zonas mais
afastadas dos grandes centros restam
dois verbos por articular: empobrecer
ou abalar. Sendo que cada um que
abala acaba sempre por sair mais pobre
do que os pobres que insistem em
ficar. Esta semana há mais uma notícia
de abalar, no duplo sentido do
termo. O Ministério da Saúde decidiu
encerrar quatro dos 12 laboratórios de
saúde pública que até agora existiam
no País. Escusado será dizer que um
destes equipamentos está sediado em
Beja (os restantes estão em Portalegre,
Coimbra e Viana do Castelo). As razões
para o fecho são, aparentemente,
economicistas. Mas só aparentemente.
Os laboratórios de saúde pública foram
criados há coisa de 40 anos com
o intuito de promover a vigilância da
água para consumo humano, das piscinas
e das zonas balneares, o diagnóstico
da tuberculose, a análise de
alimentos e o estudo das infeções tóxicas
coletivas, como é lição de má-memória
o surto da bactéria legionella.
Com o encerramento das equipagens
de Beja e de Portalegre, o Alentejo, que
ocupa uma terça parte do território nacional,
fica adstrito a um único laboratório
sediado em Évora. E só quem
não conhece a geografia da região, só
quem vislumbra que Évora é já ali, é
que pode sustentar uma ideia tão peregrina
e tão perigosa quanto esta. São
os próprios médicos de saúde pública
que alertam para os perigos que estão
associados a mais este abandono territorial.
Esta turva medida, diz quem
sabe, pode comprometer a segurança
da água para consumo e a rápida eficácia
na resposta a surtos de infeções
com origem alimentar. Isto para nem
falar no risco efetivo que existe de as
amostras para análise se deteriorarem
durante o transporte. E se a intenção
era poupar uns cobres com o fecho
destas instalações, contrapõem os profissionais
de saúde que, afinal, os custos
de operação vão aumentar, uma
vez que as amostras em trânsito têm
sempre de ser acompanhadas por médicos
e que todos os dias poderão vir a
circular milhares de colheitas. Ou seja,
estamos perante uma, mais uma, operação
de duvidoso alcance, que pode
comprometer seriamente a saúde pública
na mais vasta e envelhecida região
do País, e cujo objetivo é repetidamente
o mesmo: fazer as contas por
forma a que no final, colocando os novos
de fora, o que sobre seja nada.

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