sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Diário do Alentejo Edição 1743



Editorial

Paulo Barriga

Os cientistas vieram dizer
por estes dias aquilo
que o comum dos mortais
há muito tempo sabia. Ou, se
não sabia, pelo menos desconfiava.
Fortemente. A crise económica que
se abateu sobre o País fez disparar
a taxa de suicídio em Portugal de
forma assustadora. Para se ter uma
ideia, na viragem do século o flagelo
estava a sofrer um recuo na ordem
dos cinco por cento. Em 2012,
no zénite da austeridade, essa tendência
inverteu de forma diametral,
situando-se o aumento da incidência
de suicídios em mais de
22 pontos percentuais. A geografia
da calamidade também não é
surpreendente, ainda que carregue
consigo uma novidade: o Alentejo
continua a ser a região de Portugal
onde o suicídio é mais frequente,
embora a “mancha” se esteja a
alastrar a todo o interior centro e
norte. As causas deste “surto”, que
já aparenta feições de “epidemia”,
estão ao nível dos mais elementares
e fundamentais dos direitos
humanos: pobreza material e social,
privação no acesso aos cuidados
de saúde, iliteracia, isolamento
provocado pelo êxodo rural, fracas
condições de habitabilidade… A
incidência de suicídios nas regiões
do interior (46 por cento mais do
que nas grandes cidades) é assustadora
e revela, hoje mais do que
nunca, que já não existe um só País.
O mapa de Portugal está em definitivo
rasgado ao meio. E o rasgão
percorre-o de alto a baixo, longitudinalmente,
numa linha certeira e
cirúrgica. Que separa o litoral, sadio
e vigoroso, desta espécie de tumor
maligno em que os poderes
centrais transformaram o interior
ao longo das diferentes legislaturas.
O suicídio não é um problema
isolado, nem individual. É apenas
o mais dramático dos afloramentos
que o desespero, a falta de esperança
e o abandono social consegue
tomar. Por muitas voltas que
se lhe dê, por muitas maquilhagens
que se lhe façam, as responsabilidades
políticas sobre o estado
a que chegou o Portugal rural tem
rostos. E esses rostos vão a votos
nas eleições que se avizinham. Pelo
que, de uma vez por todas, em vez
de bailaricos e abracinhos, era importante
que os partidos com aspirações
a governar este País, rasgado
em dois, demonstrassem de
facto ao que vêm e ao que andam.
Que soluções imediatas, concretas,
urgentes, têm para esta gente que
não teme dependurar-se numa oliveira
ou que simplesmente apanha
a carreira daqui para fora. Sem
olhar para trás. Em tempo de eleições
o futuro é sempre muito risonho,
promissor, auspicioso. Mas
para o território interior, com todas
as doenças terminais que o
acomete, mal nutrido de esperança,
à beira do deserto, o futuro
é inadiável. É hoje mesmo. É agora.
É já! Percebem?

Sem comentários: