sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Diário do Alentejo Edição 1761


Editorial
Voltas
Paulo Barriga

Há muitas maneiras de dar a
volta à questão. A esta, deu-
-se-lhe a volta dando-lhe voltas.
O Baixo Alentejo tem dois eixos
viários que são fundamentais à sua integralidade
e desenvolvimento. O IP 2,
que liga o Algarve a Trás-os-Montes,
passando por Beja e Évora. E o IP 8, que
era suposto levar trânsito desde a fronteira
de Vila Verde de Ficalho até Sines.
No Plano Rodoviário Nacional de 1985,
cuja conversa, pelo menos boa parte
dela, nunca saiu do papel para o asfalto,
estes itinerários principais (IP), embora
sem perfil propriamente definido, deveriam
proporcionar condições de condução
mais rápida e mais segura nas ligações
entre as capitais de distrito e entre
estas e infraestruturas fundamentais
como portos e aeroportos. A ideia era,
de forma gradual, transformar as estradas
nacionais coincidentes com os
traçados dos IP em vias rápidas ou até
mesmo em autoestradas. Ao certo, ao
longo dos últimos 30 anos de dinheiro
europeu, não se sabe quantos projetos
foram contratados e pagos para redesenhar
de forma condigna o IP 2 e, principalmente,
o IP 8. Aliás, no governo de
José Sócrates a banda chegou mesmo a
sair à rua. Desenhou-se a autoestrada
entre Beja e Sines. As máquinas andaram
no terreno. Levantaram-se obras
de arte. Terraplanou-se. Expropriou-se.
Enfim, estoiraram-se alguns milhões
de euros. Que o governo subsequente,
o de Passos Coelho, aventou para o caixote
do lixo, deixando a estrada antiga
pior do que já estava, embora agora secundada
por uma soberba ruína dos
tempos correntes. Chamar itinerário
principal a isto é… uma boa forma de
dar a volta à questão. Já no IP 2 não se
foi tão longe. Em vez de uma autoestrada
pensou-se uma via rápida com
faixas de desaceleração, cruzamentos
desnivelados, viadutos. Muitos viadutos
e muitos deles nos locais mais exóticos.
Quando faltou o dinheiro, lá ficaram
os respetivos mamarrachos a
ganhar musgo. Há alguns meses atrás,
nos últimos suspiros do governo anterior,
os trabalhos voltaram ao IP 2. De
forma acanhada, pacata, sem dar muito
nas vistas, como acontece com aqueles
moços mais mariolas quando se preparam
para fazer das deles. E o que é que
estes moços, os da Estradas de Portugal
que agora se chama Infraestruturas de
Portugal, se preparavam para fazer?
Mariolices, precisamente. Ou melhor,
rotundas. Naquele que era suposto ser
o principal canal de comunicação rodoviário
do interior do País, prioritário,
com variantes às localidades que se lhe
atravessam no caminho, estão a crescer
rotundas. Algumas delas com grande
teor de perigosidade, mal assinaladas,
sem iluminação, onde os acidentes se
sucedem. Rotundas. Andando às voltas,
andando às voltas, lá acharam os
engenheiros do Estado uma maneira
milagrosa de espatifar automóveis (até
ver, apenas automóveis) e de acabar de
vez com a veleidade de um verdadeiro
IP no coração do Alentejo. Como se percebe,
há muitas maneiras de dar a volta
à questão.

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