sábado, 2 de abril de 2016

Diário do Alentejo Edição 1771

Editorial
Castro
Paulo Barriga

O povo tem a mania de dizer
que “apenas faz falta
quem cá está”. Também
diz que de insubstituíveis está o cemitério
cheio. Ou: “quem está, está!
Quem vai, vai!”. Não me atrevo a
dizer que o povo mente com todos
os dentes que tem na boca quando
passa estas locuções de geração em
geração. Digo apenas que, por vezes,
o povo é como o Diabo, gosta
de escrever o direito por linhas que
são tortas. Por várias vezes já aqui
o escrevi e repeti-lo-ei quantas outras
forem necessárias: somos demasiadamente
poucos e poucos
demasiadamente bons para aceitar
de ânimo leve certas partidas.
Como esta que nos pregou
agora o Manuel de Castro e Brito.
Assim, de repente. Na minha terra,
o Alentejo, que era a sua terra, em
toda a minha vida, nunca conheci,
e por certo não virei a conhecer,
homem mais criticado, mais escrutinado,
mais desdenhado, mais
vilipendiado, mais invejado do que
este. Era o alvo mais próximo, mas
apenas aparentemente mais fácil
de atingir, para a mesquinhez
e para a tacanhez local. Pela indiferença
que lhe causava as setas da
má-língua, o admirei. E muito. E
ainda mais o prezei pelo que, ainda
assim, fez pela sua terra, pelas pessoas
da sua terra, pelas instituições
da sua terra, pelo desenvolvimento
da sua terra, pelo bom-nome da
sua terra. Sim, o nome de Manuel
de Castro e Brito confunde-se com
o próprio nome da sua terra. Beja.
Essa cidade esquecida no fundo
do mapa de Portugal que, durante
tantos anos, apenas emergia
pela primavera sob a designação
de Ovibeja. Faz agora 33 anos
que Manuel de Castro e Brito, com
a ajuda de um bom punhado de
amigos, implementou o moderno
e ainda hoje atual e imensamente
replicado conceito de feira agrícola.
Uma feira total, direcionada
na essência para as pessoas, para
todas as pessoas, de todas as gerações,
de todas as proveniências sociais
e culturais. É isso mesmo que
a Ovibeja é: a Feira. Tão só, a nossa
Feira. Mas Castro e Brito não era
apenas o ideólogo da Ovibeja, enquanto
momento de recreação e de
reencontro e de elevação da autoestima
de todo este povo. Castro e
Brito era o político da política à sério.
Da política sem partidos nem
quarteis nem panos-quentes. Da
política do concreto. Era a nossa
voz, ainda que o fosse apenas uma
vez por ano, que se fazia ouvir lá
em cima. Lá nos ministérios e nos
corredores parlamentares e nos
jardins de Belém e nos telejornais e
onde calhasse. O povo tem a mania
de dizer que “apenas faz falta quem
cá está”. Eu, na morte do Manuel
de Castro e Brito, na sua falta que
é tão grande e tão pesada e tão espessa,
apenas me apetece dizer que
não, que isso não é verdade, apenas
isso… neste instante!

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