sábado, 14 de maio de 2016

Diário do Alentejo Edição 1776

Editorial   
A Europa no seu labirinto

Paulo Barriga 

A Europa está em transe e
não é preciso auscultá-la
muito profundamente para
confirmar a sua agonia. A incapacidade
para resolver e para lidar com
as crises financeiras que estalaram
nos países da periferia foi apenas
o primeiro sintoma, o primeiro sinal
de alerta, de uma enfermidade
que se julgava leve e localizada, mas
que, afinal, tinha metástases espalhadas
por boa parte do seu organismo.
Maleita que a crise dos refugiados
veio evidenciar ainda mais,
deitando por terra a maior realização
política e económica da história
da Europa no pós-guerra: a livre circulação
de pessoas, bens, serviços
e capitais num território comum.
Mas se o reerguer de fronteiras já
de si é um péssimo indício da gravidade
da doença que tolhe a União
Europeia, ainda mais aterrorizador
é a retomada de muros cautelares
que, nalguns casos, envergonhariam
as próprias SS. Ou talvez não,
uma vez que os populismos, os nacionalismos,
os segregacionismos
e a intolerância fazem hoje parte
do cardápio de vários governos europeus
e alastram como uma epidemia
descontrolada entre largas
franjas da população do velho continente,
numa onda contagiosa que
se alimenta essencialmente da austeridade,
da precaridade, da instabilidade
e do medo. Sim, do medo.
Do medo em todos os seus diferentes
valimentos. Mas especialmente
do medo de proximidade. O terror
instalou-se no coração da Europa e,
por muitas narrativas que se produzam
a este respeito, trata-se de uma
produção caseira e não de uma importação.
Não perceber esse detalhe,
ou melhor, não estudar em profundidade
as razões que levam alguns
cidadãos europeus à radicalização e
ao extremismo, é continuar a manter
a cabeça enterrada na areia dos
desertos da Babilónia. O que, mais
tarde ou mais cedo, episódio após
episódio, levará a Europa, também
ela, à radicalização, ao desespero e,
até, à desagregação. Na realidade, a
Grã-Bretanha, ao promover um arriscado
referendo sobre a sua continuidade
no projeto europeu, o
chamado “brexit”, está a dar o primeiro
passo, o primeiro empurrão
nas costas da Europa, rumo
ao precipício. Faz por estes dias 20
anos que estive pela primeira vez
em Bruxelas. Era a altura das vacas
gordas, dos alargamentos e do otimismo
europeísta. Passadas duas
décadas e muitos milhões de euros
depois, Bruxelas é uma cidade acabrunhada,
triste e numa perigosa
deriva. É o espelho da atual Europa,
no seu labirinto. O problema é que
aparenta não encontrar a ponta do
novelo que a conduza à saída. E parece
que, em vez de um, são muitos
os minotauros que lhe estão a sair
ao caminho.

Sem comentários: