quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Diário do Alentejo Edição 1554


Editorial
Muda
Paulo Barriga
Dizem que é cega, surda
e muda, a justiça. Não
a justiça que naturalmente
emana das relações humanas.
A justiça que distingue
culturalmente e socialmente o
bem e o mal. Mas antes a justiça
que é feita pelo próprio Homem
para garantir essa igualdade, retidão
e equidade nas sociedades.
A justiça legislativa, normativa,
que é feita pelos políticos e aplicada
nos tribunais, portanto. E
é dessa, que se apresenta com
uma venda nos olhos, uma balança
em perfeito equilíbrio e
uma espada punitiva, que se diz
que é cega, surda e muda. Só que
em Portugal, essa justiça do direito,
parece não sofrer de surdez,
nem de cegueira, nem de
mudez, como, sem escândalo,
se pôde constatar no arrastar até
á prescrição de dezenas de processos
onde nadam os tubarões.
Ou como se observou na triste
abertura do ano judicial, essa
espécie de luta de galos de naifas
bem afiadas. Para além de
não ser cega, nem surda, nem
muda, a justiça portuguesa não
muda. Naquilo que é fundamental,
não muda. Para além do desrespeito
pelos cidadãos que é a
medida governamental de fechar
alguns tribunais do interior,
como o de Almodôvar,
nada com substância mudará na
justiça em Portugal, o único país
dito “decente” “onde não existe
um único político na gaiola. A
justiça, a nossa justiça, é a justiça
dos ricos e dos poderosos.
É a justiça da eterna demora. É
a justiça do chico-espertismo
e dos patos bravos que, em nenhuma
outra instância como na
justiça, manifestam alegre, descarada
e impunemente a sua
manhosice. Que é uma das muitas
formas rascas de se denominar
um “bom advogado”. Um
“bom advogado”, quanto mais
caro melhor, é imbatível em
Portugal. Ainda que a “justiça”
não esteja do seu lado, um “bom
advogado” vence sempre na justiça.
De recurso em recurso. De
cifrão em cifrão. De prescrição
em prescrição. Até à impunidade
total. Enquanto esta justiça
não mudar, nunca haverá verdadeiro
respeito pela justiça. Pelos
seus agentes. Pelas instituições
em geral. E assim, a justiça, a
nossa jamais deixará de ser
mero assunto de
tabloide ou de rasca
conversa de taberna.

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