domingo, 8 de setembro de 2013

Diário do Alentejo Edição 1637

Editorial
Coração
Paulo Barriga

As cidades e as vilas e as
aldeias do interior estão
a morrer. Todas elas.
Estão a morrer porque as pessoas
estão a morrer. E, tal como
as pessoas quando morrem, as
cidades e as vilas e as aldeias
morrem porque lhes para o coração.
Sendo que o coração das
cidades, das vilas e das aldeias
do interior é o seu “centro histórico”.
O seu largo. O seu espaço
de sociabilização, de comunhão,
de união. Uma cidade, uma vila,
uma aldeia sem largo é uma entidade
incompleta. Defeituosa.
Moribunda. Os edifícios com
história, os museus, os espaços
de culto religioso, os equipamentos
culturais são fundamentais
para o bom funcionamento
do coração das cidades, das vilas
e das aldeias. Mas o mais importante
remédio contra as doenças
cardíacas dos lugares reside exatamente
nas pessoas. Um centro
urbano com pessoas residentes é
uma espécie de bypass coronário
para a boa oxigenação das cidades,
das vilas e das aldeias. Mas
será que as necessidades humanas
de hoje são compatíveis com
os desenhos urbanísticos de então?
Como se convence um jovem
facebookiano das cinturas
periféricas a viver em habitações
apertadas, sem local para estacionar
o carro e com o contentor
do lixo a mais de 50 metros
da porta de casa? Não é fácil, por
certo. Mas é por aqui. Não basta
estender lajedos no chão do coração
e dos ventrículos dos sítios.
Não basta iluminá-los com
candeeiros bizarros. Não basta
alindá-los. São necessárias verdadeiras
políticas integradas de
regeneração urbana, paisagística,
habitacional e cultural. O
centro das cidades, das vilas e
das aldeias tem de tornar a ser
bom para viver e para conviver.
Tem de tornar a ser de todos e
para todos. Tem de tornar a ser
o centro do mundo, como diria
Manuel da Fonseca. O exemplo
mais chocante de enfermidade
cardíaca das cidades é a praça
da República de Beja. A intervenção
do programa Polis foi ali
uma verdadeira catástrofe estética
e funcional. Os edifícios estão
maioritariamente abandonados,
desabitados, tristes. O
comércio tradicional esticou o
pernil. A animação é praticamente
inexistente. As esplanadas
estão desertas. As tentativas
de realojamento falharam. E
quando tudo falha em torno do
coração, é o próprio coração que
falha. Mais tarde ou já agora,
quando as únicas enchentes na
praça da República se formam à
porta das Finanças ou do Centro
de Emprego. Não são sinais, são
sintomas deste tempo

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