sábado, 12 de julho de 2014

Diário do Alentejo Edição 1681

Editorial
Ciganos
Paulo Barriga

Há um purismo instalado
nos media e nos meios do
Estado em geral que impede
a utilização do termo cigano.
Assim. Sem mais nem menos. A
abolição da palavra “cigano”, de
forma isolada, está relacionada
(mal relacionada) com uma certa
militância ativa contra a estandardização
do termo e a segregação
desta “raça”. Dizer “raça
cigana”, como aqui se disse, acarreta
uma emenda ainda pior que
o soneto. Para lá de ser um conceito
politicamente incorreto, a
noção de “raça”, utilizada para referir
diferentes “populações” da
mesma espécie biológica e com as
mesmas características genéticas,
há muito que cientificamente deixou
de se aplicar à Humanidade.
Poderíamos então aludir à existência
de uma “população cigana”.
A Biologia diz que sim. Que
“população” é um grupo de indivíduos
que acasalam uns com os
outros. Mas aí os problemas éticos
seriam os mesmos que encontraríamos
para “raça”. Já a Sociologia
propõe que uma “comunidade”
seja o conjunto de pessoas que
vive num certo espaço, por um
determinado período de tempo. O
que, sabemos bem, não se aplica a
esta “etnia”. “Etnia cigana” é a designação
que mais agrada aos puristas.
Mal, já que “etnia” define
uma ideia externa. A visão que
terceiros têm sobre um grupo de
pessoas com semelhanças biológicas
ou “culturais”. É uma espécie
de rótulo imposto pela “raça”,
“população” ou “etnia” dominante.
Resta, talvez, a “cultura cigana”.
Será? Numa acessão muito
aberta, “cultura” é o intricado somatório
dos costumes, das crenças,
da arte, das leis, nas normas
que faz de um determinado homem
elemento de uma certa sociedade.
E só quem não conhece
a história dos “ciganos”, a sua origem,
as migrações intermináveis
a que foram sujeitos, as deportações
coercivas a que foram sujeitos,
a dispersão e as perseguições
a que foram sujeitos é que pode
encontrar tal uniformidade cultural
mesmo entre as diferentes
famílias. Por muito próximas que
elas sejam. Veja-se o que aconteceu
há dias em Vidigueira. Uma
desavença entre famílias acabou
aos tiros. E a autarquia acabou
com as desavenças arrasando por
completo o local onde viviam. É a
Lei de Talião no seu estado mais
puro. Que é aplicável porque se
trata de ciganos. Que, como vimos,
é “gente” sem raça, sem população,
sem comunidade, sem
etnia, sem cultura. Mas será que
em certos locais do País “gente”
é um termo aplicável a “cigano”?
Já agora, “gente” é apenas um dos
diferentes sinónimos de “pessoa

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