quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Diário do Alentejo Edição nº 1764

Editorial
Orçamento
Paulo Barriga

O Português é um especialista
nato. E variado.
É um bom entendedor
das coisas que o rodeiam, das
coisas que o afetam e, de forma
ainda mais profunda, das coisas
que nem o rodeiem ou afetem. O
Português é um perito encartado
em matérias tão díspares que podem
ir desde o mais complexo
processo de direito penal às boas
práticas digitais na condução automóvel.
Da alta finança à baixa
política, passando a meio pelo futebol.
Das grandes questões que
acometem o mundo e a humanidade
à evidente falta de jeito conjugal
do vizinho do 6.º B. À sua
vastíssima galeria de virtudes e de
aptidões naturais para o comentário
e para o botar de opinião, juntou
agora o Português uma nova
disciplina: o “orçamento”. Corrijo,
o enamoramento do Português
face ao “orçamento” não é bem de
agora. Suponho que o Português
se tenha dado conta da existência
de um “orçamento” para governar
o País, no exato instante em
que deixou de haver “orçamento”.
Restarão, por certo, poucas exultações
para memória futura sobre
a passagem da troika por
Portugal. Mas ninguém poderá
negar que, com ela, o Português
ficou muito mais versado no que
toca ao “orçamento”. E toda essa
instrução está a vir agora ao de
cima, neste tempo de novo “orçamento”
e, claro, de grande entusiasmo
para os especialistas.
Que é como quem diz, para o
Português. Na verdade, ainda não
deu para perceber lá muito bem
se o “orçamento”, este, puxa mais
para cá se para lá, se é mais amigo
ou mais torcido, se é mais austero
ou se prima pela brandura, se traz
mais dinheiro para a economia
ou se exige mais economia de dinheiro.
Mas o Português, provenha
ele da mais épica canhota ou
da mais alta direita, já tem a sua
opinião formada e bem formada
e ao detalhe da argumentação. O
que não deixa de ser algo incomodativo.
Principalmente para
quem tiver necessidade de abastecer
em bombas de gasolina self-
-service. E tiver o azar de o fazer
em determinadas alturas do dia.
Aquelas em que o Português especialista
em “orçamento” gosta de
ir tomar a bica e discorrer sobre
as notícias dos jornais que lá estão
expostos para venda, mas que
o Português não compra nem lê.
Sim, dizem que os impostos sobre
os combustíveis vão crescer com o
presente “orçamento”. Mas o que
deveria mesmo ficar pela hora da
morte era a venda de cafezinhos
nas bombas de gasolina. Esse tique
estranhíssimo, contranatura,
que é tão irritante como qualquer
outra das múltiplas especialidades
do Português. As orçamentais,
por exemplo.

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